Page 41 - INSTITUTO HISTÓRICO VOL XI
P. 41

Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros

                    tes semelhantes. Reputamos como o mais interessante a his-
                    tória de Ritinha e Izabelona, duas ex-escravas que, junta-
                    mente, comemoravam anualmente a abolição da escravatu-
                    ra. Ritinha era a carpideira-mor, especialmente dos defuntos
                    mais abastados. Sempre a soluçar, em seu choro falava:


                            Essa boquinha? Nunca falou mal de ninguém, só tinha boca para
                            comer.
                            Essa mãozinha? Nunca ofendeu uma pulga.
                            Esses olhinhos? Nunca olhavam o que não era de sua conta.

                         E seu choro continuava para o importante defunto.
                         Apresenta-nos, também, Hermes de Paula (1957,
                    p.211), outro exemplo de convivência e lida com a morte,
                    cuja prática se torna imparcial e incólume aos sentimen-
                    tos. É o caso do coveiro Leandro, do cemitério municipal
                    de Montes Claros, denominado de ‘Chacrinha do Lean-
                    dro’ em decorrência de seu zelo com aquele campo santo.
                    Sempre atencioso, inclusive ao oferecer seus préstimos,
                    assim dizia:
                         “Já plantei aqui seu avô, (Eta véio bom!) sua avó (uma
                    santa!), seu pai (especial!) e, se Deus quiser, o Sr. pode
                    contar com a minha ajuda”.
                         Hermes de Paula (1957) ainda comenta que, depen-
                    dendo do prestígio do morto, o ritual se dava de maneira
                    mais solene. O féretro era transportado pelos amigos a
                    partir da igreja até o cemitério e, no caso de pessoas co-
                    muns, o caixão era transportado em carro fúnebre. E, ain-
                    da, como prestígio, o enterro era acompanhado por Ban-
                    da de Música. Essas práticas, hoje, seriam impossíveis, pois
                    até os velórios residenciais caíram em desuso, bem recen-
                    temente. A vida mudou e a morte também!

                         Memorial da morte no norte de Minas
                         Em Montes Claros, como em milhares de cidades do
                    período colonial, a igreja servia de último leito, abrigando
                    o morto junto aos santos e seus olores, em busca da indul-
                    gência e do paraíso.

                                                                             41
   36   37   38   39   40   41   42   43   44   45   46