Page 39 - INSTITUTO HISTÓRICO VOL XI
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Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
Maria. Os sitiantes percorrem um longo caminho tocando
matraca e parando em frente a cruzes para realizar essa
oração sete vezes. No final, canta-se pela “alma dos es-
quecidos”, “dos que morrem afogados”, “dos que mor-
rem matados”. A oração é finalizada com uma recomen-
dação das almas:
Seja Bendito
Para sempre seja louvado
O Corpo de Cristo Sacramentado
A Maria Sagrada da Eucaristia
E do fruto e do ventre sagrado
Para a virgem Puríssima Santa Maria (FUKUI,1983)
Pode-se notar, então, que mais que revelar os inters-
tícios do ritual dos sitiantes ao apresentar alguns pontos,
a intenção é demonstrar que nem sempre, na atualidade,
homens e mulheres desejam um afastamento da morte ou
um esquecimento dos seus mortos. Como fica claro, os
habitantes de Laranjeiras, na Recomendação das Almas,
expõem seu desamparo e seu sentimento de opressão so-
cial. O que se celebra é a morte de todos, visto que na
Quaresma – período em que não se tem auxílio dos san-
tos, pois estão ‘recolhidos’ – eles estão sozinhos e aflitos.
Desse modo, nas palavras de Fukui (1983), quando a vida
está desequilibrada é o momento de apelar aos mortos, às
almas como intermediárias dos mortais, como um apelo
dos vivos aos mortos, em nome do desamparo da vida.
Nomear os parentes, os vizinhos, os que morrem esqueci-
dos, os que morrem matados constitui a prévia de resga-
tar, no sábado de Aleluia, o equilíbrio da vida e o pacto
com os santos.
No início do século XX em Várzea da Palma, no
sertão norte mineiro, Maria Aparecida de Paula teve
interesse em reunir em uma obra ‘Assim era Jasminó-
polis’ algumas passagens de ritos funerários da primei-
ra metade do século XX, em que as rezas e incelenças
eram cantadas em altas vozes para que toda a cidade
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