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Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
1913, foi nomeada por Delfim Moreira da Costa Ribeiro, Secretário Eponina nunca namorou, mas pode ter tido uma paixão oculta.
do Interior do Estado de Minas Gerais, professora de Matemática no Não se falava o nome daquele amor. Um acontecimento assim talvez
Grupo Escolar Gonçalves Chaves, lugar onde lecionou por muitos a tenha feito escrever um romance com o pseudônimo de Jerusa Mo-
anos, chegando a Diretora. Não se casou. Seu irmão João Antônio roni, “Amar e Sofrer”, um manuscrito em letras miúdas e redondas,
casou-se com Judith Couy Pimenta de Carvalho e com ela teve doze numa cópia sem erros, o qual chegou às mãos do Bispo Dom Hélder
filhos. Certa ocasião, já com quatro filhos, o casal precisou viajar para Câmara, em Recife.
Capelinha, e, devido à dificuldade da viagem em lombo de burro, op- Alta, pele morena clara, cabelos finos e curtos repartidos ao
tou por deixar o filho mais novo, Félix Alexandre, nascido há poucos meio, e numa fase, presos em coque, não adoecia, tinha voz firme de
meses, com a Tia Eponina. Após um ano, a família retorna, porém, timbre forte e se trajava à maneira antiga, até mesmo para a época,
Eponina manifesta o desejo de continuar com o sobrinho, a mãe hesi- usando saia comprida e blusa de mangas compridas, geralmente na
ta, mas o menino já era considerado filho pela tia. Conta Félix: “Dom cor preta e sapatos fechados. Morou no palácio do bispo Dom João
João Antônio Pimenta, tio do meu pai, intercedeu dizendo à Mãe Antônio Pimenta com o filho, que viu da fresta da porta um ato de
Judith: ‘Eponina não tem filho. Você tem mais três. Deixa o menino exorcismo feito pelo tio-avô. Talvez Eponina quisesse que Félix visse
com ela’. Mãe Judith deixou. Nisso, Mãe Eponina me pegou enrolado o fato.
num pano, e me levou” – fala Félix, chorando forte, com o rosto ver-
melho, tremendo todo o corpo. Não dá para ter certeza se a emoção A professora morava na Praça Portugal, número 28 e zelava pela
é pelo fato de a Tia (Mãe Eponina) tê-lo tomado ou pela Mãe Judith Igreja do Rosário que ficava em frente a sua residência. Sua casa, que
tê-lo dado, ou ambos os lados daquele doloroso momento. lhe foi passada pelo bispado, estava no nome do filho com usufruto
dela. A moradia era simples, de assoalho e móveis antigos, de madeira
Eponina exercia a profissão de professora de Matemática com candeio, que estão na família há 150 anos. Tinha onze cômodos e
seriedade e sabedoria. Era competente e sensata, com temperamento quatro quartos. Eponina usava um dos quartos com a mãe, e os outros
severo e exigente, mas, ainda que rígida, sabia ser carinhosa na hora ela alugava para moças de fora, que vinham estudar em Montes Cla-
certa e proporcionou uma educação primorosa a Félix. Desde cedo ros no Colégio Imaculada Conceição. O sobrinho Geraldo Pimenta
seu filho frequentou estúdios de fotografias, sempre muito bem ves- também morava na casa dela. Para melhorar sua renda recebia hós-
tido e bem cuidado, a ponto de colecionar alguns álbuns de retratos. pedes, tais como Dona Dinorá e Vicente Pimenta, aparentados dela.
Com alunos e com o filho fazia cumprir o rigor das normas, mas era
justa, e ainda que corrigisse com castigo, não batia. Félix chegou a Havia uma cristaleira que ela gostava muito e um velho relógio,
ser aluno da sua mãe, e uma vez, cometeu um erro e foi castigado. além de muitas imagens de santos pela casa, com destaque para uma
Encontrou uma prova de Matemática com as respostas e as passou Nossa Senhora Imaculada Conceição dentro de um oratório que fica-
aos colegas, inclusive ao futuro médico Elton Rocha Lessa. Eponina va no quarto dela, com uma vela acesa permanente. As peças sacras,
prometeu e deu zero a ele. Implacável, quando necessário, também que eram obras de arte, pertenciam ao Bispo e ao Palácio Episcopal.
o colocava contra a parede ou numa cadeira ou não o deixava ir ao Félix guarda uma Bíblia que pertenceu à Mãe Eponina, além de vários
matiné no antigo Cine Montes Claros. terços e um rosário, com o qual ela rezava.
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