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Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros  Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros
  O teclado estava desprezado há mais de 3 anos, pois faltava   da. Que pena! Adiei também a viagem à Grécia, um sonho antigo,
 tempo, mas agora, “quem canta, seus males espanta”. E lá vou eu re-  passando pela Itália, esse ano impossível, e outras viagenzinhas por
 cordar as músicas do passado: “A deusa da minha rua...” preferida da   aqui mesmo, que já estavam agendadas.
 minha mãe, quando juntas ficávamos atrás da janela da minha casa   Aprendi numa pós-graduação que existe uma árvore dos me-
 ouvindo as serenatas. Quanta poesia nessa música, coisa que as mais   dos: há o “medinho” (medo de barata, por exemplo); o “medo” pro-
 modernas não têm: só falam em “dor de cotovelo”, em traição e outras   priamente dito (medo de assalto, do escuro, etc.) e o “medão”, um
 coisas. E até mesmo palavrões, nada de poesia. “Na rua uma poça d´á-  medo bem grande. Creio que agora nessa quarentena estamos tendo o
 gua, espelho da minha mágoa, transporta o céu para o chão...” Pen-  “medão”, que é o medo da doença e da morte. Mas lembro bem que a
 sem bem: como o céu pode ser refletido no chão através de uma poça   Bíblia nos conta que quando os discípulos de Jesus estavam num bar-
 d´água? Só mesmo um poeta apaixonado. E o final: “Ela é tão rica,   co e sobreveio uma tempestade, eles tiveram um grande medo, de se
 e eu tão pobre, eu sou plebeu, ela é nobre, não vale a pena sonhar...”
              afogar e de morrer. Mas Jesus estava no barco e acalmou a tempestade.
 E os rapazes, de violão em punho, com lanternas para lerem as   Creio firmemente que Ele agora irá também acalmar essa tempestade
 músicas, pois que não tinha iluminação, embora fosse noite de luar.   que estamos vivendo. É preciso ter fé.
 Depois cantavam a minha: “Eu sonhei que tu estavas tão linda...”  Li um texto do Rubem Alves que diz que otimismo é diferente
 Hora de ir preparar o almoço e aproveito para fazer pão de   de esperança. Segundo ele, otimismo é a gente acreditar que há pri-
 queijo e pãezinhos, que há muito tempo não fazia. Não tinha tempo.   mavera aqui dentro enquanto há primavera lá fora. Mas esperança é
 Tenho ainda que cuidar da casa e fazer minhas tarefas a que me pro-  acreditar que mesmo estando nublado lá fora, há primavera em nos-
 pus no início da quarentena. Mas o tempo não está sobrando. Até fiz   sos corações. É ainda ele quem diz:
 uma lista e vou checando a cada dia. Não é a lista do Montenegro:   “Mas é preciso escolher. Porque o tempo foge. Não há tempo
 “Fiz uma lista de grandes amigos...” É uma lista de tarefas mesmo. O   para tudo. Não poderei escutar todas as músicas que desejo, não po-
 curso virtual está congelado. Tenho que verificar a cada instante as   derei ler todos os livros que desejo, não poderei abraçar todas as pes-
 mensagens e chamadas do celular, para ficar por dentro das notícias   soas que desejo. É necessário aprender a arte de “abrir mão” – a fim de
 da família e dos amigos, porque as notícias alarmantes, eu deleto sem   nos dedicarmos àquilo que é essencial.”
 ver. Nas poucas horas vagas e até chegar a hora de ir para a cama, vejo
 filmes que não sejam de terror nem de guerras ou violência. Vi um   Se tenho fé, tenho esperança. E é por isto que já estou fazen-
 muito bom: “O milagre da cela 7” e recomendo.  do planos para o pós-quarentena. Porque acredito no amor de Deus;
              porque acredito que tudo vai passar; porque acredito que Jesus está
 Mas não me esqueço também dos momentos de oração, como   no nosso barco e brevemente estaremos todos juntos novamente, nos
 o Terço da misericórdia todos os dias, pedindo a Deus que “Tenha   reunindo e nos abraçando.
 misericórdia de nós e do mundo inteiro...”
 Tive que cancelar várias viagens, inclusive a do meu aniversário,
 quando iríamos à Diamantina para a vesperata, a família toda reuni-


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