Abnegação

 

No estudo da abnegação, fitemos em Cristo
o exemplo máximo.

Emissário de Deus entre os homens, podia
exigir um palácio para nascer, mas preferiu
asilar-se no abrigo dos animais.

Podia freqüentar, na meninice, os mais altos
grêmios filosóficos e religiosos da nação que
o contava entre os seus; todavia, preferiu as
rudes experiências da carpintaria de Nazaré.

Podia aderir aos programas de dominação dos
maiorais em Jerusalém, impondo-lhes as sua
própria condição de missionário excepcional;
entretanto, preferiu incorporar-se ao trabalho
de pescadores humildes, revelando-se a eles
sem violência.

Podia escolher as damas ilustres para
entreter-se, com elas, acerca do Reino de
Deus, através de tertúlias afetivas no terraço
de casas nobres; contudo, preferiu entender-se
com as mulheres simples do povo, sem esquecer
a filha de Magdala, submetida aos flagelos da
humilhação.

Podia insinuar-se no ambiente mais íntimo de
Caifás ou Pilatos e agradar-lhes a parentela
para ganhar influência; no entanto, preferiu
aproximar-se dos enfermos esquecidos na via
pública.

Podia acumular ouro e prata, mobilizando os
poderes de que dispunha, mas preferiu viver
entre os desfavorecidos do mundo, sem reter
uma pedra onde repousar a cabeça.

Podia afastar Iscariotes do círculo doméstico,
depois de perceber-lhe os primeiros sinais de
deserção; todavia, preferiu conservá-lo entre
os aprendizes, para não lhe frustrar as
oportunidades de reajuste.

Podia agitar a multidão contra os detratores
de sua causa; entretanto, preferiu que os
detratores a comandassem.

Podia recorrer à Justiça de modo a defender-
se contra a perseguição sem motivo; no entanto,
preferiu morrer perdoando aos algozes,
alinhando-se entre os condenados à morte sem
culpa.

Não te despreocupes, assim, da abnegação
dentro da própria vida, a fim de que possas
auxiliar as vidas que te rodeiam.

Supérfluo que nos enfeita é carência que
aflige os outros.

O grande egoísmo da Humanidade é a soma dos
pequenos egoísmos de cada um de nós..

Sofrer por obrigação é resgate humano, mas
sofrer para que outros não sofram é renúncia
divina.

Ninguém sabe se existe virtude nos
prisioneiros da expiação; entretanto, a
virtude mostra-se viva em todo aquele que,
podendo acolher-se ao bem próprio, procura,
acima de tudo, o bem para todos.

Se podes exigir e não exiges, se podes pedir
e não pedes, se podes complicar e não
complicas, se podes parar de servir e
prossegues servindo, estarás conquistando o
justo merecimento.

Não vale, pois, reclamar a abnegação dos
outros para a melhoria do mundo, porque o
próprio Cristo nos ensinou, à força de exemplos,
que a melhoria do mundo começa de nós.

(Religião dos Espíritos - Emmanuel -
Francisco Cândido Xavier)