Livro:
Lindos Casos de Bezerra de Menezes
Ramiro Gama
A companheira do abnegado médico já
havia combinado com o amigo Cordeiro para cobrar aos
que pudessem pagar à razão de cinco
mil réis por consulente. O dinheiro não
passaria pelas mãos de Bezerra e deveria ser
encaminhado a D. Cândida. Bezerra sabia disto
e concordou desde que recebesse apenas dos que estivessem
em condições de pagar...
Certa
vez, penetra no seu consultório da Farmácia
Cordeiro uma pobre mulher com uma criança ao
colo. Sentou-se e apresentou-lhe o filhinho para exame.
O
aspecto da pobre mulher como o da criança traduzia
miséria e fome.
Bezerra
atendeu à criança. Sentiu-lhe o físico
em mísero estado. E receitou, aconselhando
à mão sofredora:
-
Minha filha, dê a seu filho estes remédios
de hora em hora. São remédios homeopáticos
e, se desejar, pode comprá-los aqui mesmo...
-
Comprá-los, doutor, com quê, se não
tenho comigo nenhum níquel! Se eu e meu filho
estamos até agora em jejum...
O
bondoso médico olhou para a mãe sofredora.
Seus olhos mansos e verdes, refletindo compaixão,
encheram-se de pranto.
Ambos
choravam!
O
ambiente deveria ser tocante e vestido de luz e amor!
Abraçando-a,
disse-lhe Bezerra: Não se apoquente, minha
filha, vou ajudá-la. Confiemos no amor da Virgem,
que vela por todos nós.
Procurou
nos bolsos das calças e do paletó algum
dinheiro e nada encontrou.
Pôs-se
a pensar, olhando para cima, como se fizesse uma Prece
muda e sentida.
De
repente, fazendo-a sentar-se, sai e procura seu amigo
Cordeiro, também manso e bom.
-
Cordeiro, prometi-lhe não mexer no dinheiro
das consultas, a fim de que você o encaminhe
diretamente à minha esposa. Mas o caso de hoje
é doloroso... Já rendeu alguma coisa?
-
Nada, porque os doentes, até agora, são
pobres e como sua ordem é para receber apenas
dos que podem pagar...
-
E o resultado de ontem, já o entregou?
-
Não, está ainda comigo.
-
Dê-me, então, este dinheiro e esperemos
na proteção da Virgem, que há
de nos mandar algum, mais tarde.
Cordeiro
lhe atendeu. Bezerra penetra o consultório.
E,
dirigindo-se à infeliz irmã em provas:
-
Tome, minha filha, este envelope. Com o dinheiro que
está aí, compre remédios, também
leite e alimentos para seu filho.
A
pobre mãe, de olhos surpresos, lacrimosos,
lábios trêmulos, tartamudeia e nada pode
dizer para lhe agradecer. Chora...
E
Bezerra, abraçando-a:
-
Nada de lágrimas, vamos, vá na santa
Paz de Deus e que a Virgem a proteja e o seu filhinho.
Ele há de ficar bom...
Assim
atendida, a sofredora mãe deixa o consultório.
E,
quando volta, da porta, para agradecer, ouve apenas
a voz mansa e boa de Bezerra:
-
Entre aquele que estiver em primeiro lugar.