Primavera
em Brasília
Wanderlino
Arruda
BRASÍLIA
– Não precisa nem dizer que o governo vai mal,
fraco, confuso, desorganizado, às vezes acéfalo,
às vezes bicéfalo, com um presidente aqui e
outro viajando com toda a comitiva que julga ter direito.
Ninguém entende nada, quando tudo o que é mistério
entre ou quer entrar em greve, sem ministro para negociar.
Como Brasília só faz economia nos fins de semana
e nos feriados, porque aí o governo não pode
gastar, muita gente bate palmas quando tudo está parado,
sem desperdícios. Interessantíssimas as manchetes
dos jornais, o comentários da televisão e do
rádio, as faixas e os cartazes monumentais. Só
assim para se ver gente em Brasília, além dos
transeuntes da passarela acima da rodoviária, entre
os conjuntos Nacionais e Conic.
Mas, se tudo é confuso na visão da perspectiva
humana – governo contra povo e povo contra governo –
porque é impossível o entendimento pelo jogo
de interesse sempre contrariado, há o outro lado bonito
e quase transcendental, com a Natureza em festa de Primavera.
Tudo em Brasília, que depende do tempo e das chuvas,
do vento e das luzes mais claras do dia e a noite, está
um espetáculo de grandeza, um verde que não
acaba mais. Os gramados – e como eles agradecem a água
do início da estação chuvosa estão
lisinhos, novos, brilhantes, compactos, convidativos para
ver e um pisar macio, pois não proibitivos ao andar,
são como tapetes ou alcatifas encantadas.
Lindos, lindos, imensos, quase infinitos, tão extensos
como a longe distância do horizonte de um esmeraldino
mar do Ceará.
Dá gosto andar por Brasília, nesta Primavera
de muitas cores, principalmente o verde-escuro das folhas,
das árvores. As mangueiras, os abacateiros, as sucupiras,
os cedros estão dignos de uma vereda do paraíso.
Livres, na imensidão dos espaços, balançam
ao vento e à brisa, seduzem a visão do caminhante
calmo e sem pressa, isento da violência ou do perigo
ainda não existente no Plano Piloto. O verde, o vermelho,
o amarelo, o violeta, dezenas ou centenas de matizes maravilhosamente
belos contratam com as branquidão dos edifícios
públicos, branquíssimos pela pessoal escolha
de Niemeyer, significativos da paz e da paciência brasileiras.
Tudo brilha com o sol de Brasília, pois não
há luz mais clara e mais transparente.
Com cerca de vinte metros quadrados de área verde para
cada habitante, a cidade da Esperança é um convite
à alegria e à solidão ao mesmo tempo.
Não existe, em nenhum outro lugar do mundo, uma amplitude
maior. É só distâncias, lonjuras de nunca
acabar, geometria quase divina de Lúcio Costa, uma
cidade preparada para o vôo de liberdade pelas auroras
e crepúsculos mais lindos da face da terra. Daqui,
da varanda do meu apartamento no Garvy Park Hotel, no alto
do sétimo andar, contemplo, sonhadoramente, a região
Oeste, um pouco do Sul, um pouco do Norte, receptadores de
toda a luz da manhã, e o Eixo Monumental, a Torre,
os edifícios e hotéis do Setor Sul, bem longe,
o Centro de Convenções, o Planetárium,
os Palácios do Governo do Distrito Federal. O Monumento
JK desaparece nas névoas do infinito, onde está
a linha de separação entre a terra e o céu!
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