Mulher
bonita no carnaval
Wanderlino
Arruda
Tinha
que ser n Rio de Janeiro, lugar privilegiado no sambódromo,
escolha de Paulo César Santiago, que sabe das coisas
cá e lá. Setor quatro ou cinco, cadeiras de
pista, segunda fila, para ficar bem pertinho da passarela,
corredor de desfile do maior espetáculo da Terra, bem
e mal revestido de todas as cores e sons que olhos e ouvidos
mortais podem perceber. Atrás, as arquibancadas que,
vistas de perto, parecem montanhas, enormes massas humanas
arrumadas numa prateleira de alegria. À frente, de
lado, à esquerda, à direita, perto, longe, a
visão dos camarotes da granfinagem pagante e aproveitadora
das mordomias, garçons na azáfama do bem servir,
rapazes de compleição robusta, moças
douradas de sol-verão, mulheres bonitas e faceiras
com mais corpo à mostra do que roupa, guris e gurias
metidos à gente adolescente e despreocupados, homens
de mais idade com jeito de financiadores de todas as festas.
No asfalto, entre uma escola e outra, o pessoal da limpeza,
os carros de mangueiras esguichantes, alguns artistas caminhando
displicentemente para serem aplaudidos. Mundo, mundo, vasto
mundo!
Vale a pena ver o carnaval da Sapucaí, no Rio de Janeiro.
Pelo menos vez na vida, uma só que seja. Será
visão inesquecível para nunca ser apagada da
retina, uma constante repetição de cenas de
jamais acabar vida a fora. De pé, sentado, deitado,
de cócoras, agachado, encostado, debruçado,
seja lá como for, vá lá brasileira ou
brasileiro, que o carnaval é seu, eterna glória
deste país de pouca seriedade incrível bom gosto
para momentos de descontração. Nada mais dirigido
ao encanto do que o Rio de Janeiro durante o reinado de Momo
e do povão, de quando o morro desce para a planície
com os couros de todos os gatos transformados em cuícas
dolente se safadas. Cidade maravilhosa e sem compromisso além
da ginga e das sacudidelas do samba no pé, jeitos e
trejeitos malandros, balanço de ancas, sorrisos e bocas
de malícia, coxas e seios oferecidos aos milhares,
que o paladar de Eros nunca se cansa ou se extingue.
Lá estávamos nós, quatro homens e quatro
mulheres em duas mesas ao lado de outras onde estavam turistas
também ávidos de visões que só
o carnaval carioca pode oferecer. Aqui, ali, ao redor, escandinavos,
bretões, latino-americanos, japoneses, gringos de toda
espécie, judeus, árabes parecendo xeiques com
sus concubinas. E quem éramos nós? Nídia
e Paulo César, Maurinéia e Valdeir, Judith e
Du Jabbur, Olímpia e eu. Oito, valendo por uns oitenta,
porque preparamos para umas doze horas de contemplação
e sonhos: uísque, gim, uma garrafa de Havana, “cointreau”,
salgadinhos, sanduíches, biscoitos, de um tudo como
diria um nosso poeta amigo. Quem pensar que pode ver o carnaval
da Marquês tranqüilamente, sem levar o que comer
e beber, está agindo errado. As filhas dos barzinhos
improvisados são piores que as filas de ônibus
de porta de fábrica as seis da tarde.
A iluminação do Sambódromo é algo
parecido com a claridade do sol de meio-dia ou ainda mais.
Tão clara, que é impossível alguém
pensar em sono ou mesmo ter algum momento de cochilo. Hora
de supervida, de vier intenso, feliz vigília para não
perder nada, nada ficar sem a nossa participação
de aplauso ou acompanhamento interessado. Calor? Chuva? Pode
vir o que vier, o que a Natureza mandar, que não é
qualquer tempestade ou qualquer aguaceiro que vai tirar o
nosso bom humor. Festa é festa! Cada detalhe há
de passar pelo rastreamento do binóculo de Du Jabbur,
pertinho ou bem distante. Serão vistas e analisadas
cada escola, cada janela de camarote, cada bancada de escadarias,
cada grupinho no setor de mesas, o trabalho dos jornalistas,
dos seguranças, de todos os incontáveis membros
das incontáveis equipes da Riotur. Um de cada vez terá
direito a algum tempo de olhada, e quem tiver mais sorte de
ver mulher mais bonita, tem obrigação de mostrar
para os outros. Companheirismo, uai!
Era para falar de uma mulher bonita, linda, lindona, maravilhosamente
linda que vi pelo binóculo, que iniciei esta crônica,
mas, espaço terminado, deixo para outra vez. Há
quatro anos tento fazer isso, escrevi várias vezes
e não deu pé. Esta, mais uma crônica que
escrevo para falar da encantadora morena do carnaval, mas
acabo falando demais como introdução e cenário,
e não consigo chegar ao alvo. Pena! Garanto que você
que me lê é que está perdendo, porque
boniteza como aquela nunca existiu ou existem poucas. Um dia
você verá! É uma estória interessantíssima
que ainda publicarei. Palavra de quem guarda o segredo!
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