Tomaz
Antônio Gonzaga
Marília
de Dirceu
Lira
III
De
amar, minha Marília, a formosura
Não
se podem livrar humanos peitos.
Adoram
os heróis; e os mesmos brutos
Aos
grilhões de Cupido estão sujeitos.
Quem,
Marília, despreza uma beleza,
A luz da razão precisa;
E se tem discurso, pisa
A
lei, que lhe ditou a Natureza.
Cupido
entrou no Céu. O grande Jove
Uma
vez se mudou em chuva de ouro;
Outras
vezes tomou as várias formas
De
General de Tebas, velha, e touro.
O
próprio Deus da Guerra desumano
Não viveu de amor ileso;
Quis a Vênus, e foi preso
Na
rede, que lhe armou o Deus Vulcano.
Mas
sendo amor igual para os viventes,
Tem
mais desculpa, ou menos esta chama:
Amar
formosos rostos acredita,
Amar
os feios de algum modo infama.
Que
lê que Jove amou, não lê nem topa,
Que ele amou vulgar donzela:
Lê que amou a Dânae bela,
Encontra
que roubou a linda Europa.
Se
amar uma beleza se desculpa
Em
quem ao próprio Céu, e terra move:
Qual
é a minha glória, pois igualo,
Ou
excedo no amor ao mesmo Jove?
Amou
o Pai dos Deuses Soberano
Um semblante peregrino:
Eu adoro o teu divino,
O
teu divino rosto, e sou humano.