Adauto
Freire me traz, depois de mostrar a vários colegas
de banco e fazer a maior propaganda do seu passado histórico,
um folheto amarelecido de publicidade do nosso antigo programa
de rádio “Atualidades Estudantis”. O papel
fininho, dobrado, emurchecido como uma flor seca em folhas
de livro, é uma velha obra de arte da mui antiga Gráfica
Orion, tenho impressão, composta pelo próprio
Laerte David, onde todos nós jovens estudantes fazíamos
ponto, diariamente, para discutir religião, política
e assuntos de alta relevância do povo e do mundo. Que
grata lembrança pegar numa relíquia de vinte
e sete anos! Quão agradável lembrar de feitos
de jovens descomprometidos com tanta coisa que a vida nos
impõe nos dias de hoje! Só não agradeço
muito ao Adauto para ele não ficar achando que sou
um irremediável sentimental.
“Atualidades
Estudantis”, era um programa de rádio produzido
e dirigido pelo Diretório dos Estudantes, que tinha
sede lá na Praça Cel. Ribeiro, contra-esquina
com o Hotel São José, no sobradinho onde hoje
fica o escritório de Ivani. A Rádio Sociedade
ficava na Rua Quinze, numa sala do terceiro andar do prédio
da Gazeta do Norte, ao lado da Imperial, em frente à
Luso-Brasileira dos irmãos Antônio e Artur Loureiro
Ramos. Íamos para a D-7 todos os domingos, mais ou
menos depois do meio-dia e, só lá, aproveitando
papel e máquina, é que começávamos
a produção de notícias, de comentários,
e Adauto inventava as piadas e Cerdônio Quadros poetava
as poesias para Marilene Magalhães declamar. Não
sei como, mas, apesar de toda improvisação,
o programa nunca atrasou. Às vezes, em meia-hora, escrevíamos
tudo o necessário para falar trinta minutos ao microfone.
O
volante de propaganda que recebo agora é claríssimo
sobre nossas atividades, um espelho excelente da velha realidade
de um grupo de jovens que sonhava com humildade mas com uma
garra impressionante de confiança no futuro. “Uma
das mais brilhantes iniciativas do Diretório de Estudantes
de Montes Claros, “Atualidades Estudantis” é
um programa completo: comentários, notícias,
crônicas, poesias, curiosidades, humorismo e Consultório
Sentimental”. Estas últimas palavras vinham sublinhadas
porque eram o bloco mais importante do horário. “Atualidades
Estudantis” conta com a colaboração dos
seguintes estudantes: Adalto Freire, Marilene Magalhães,
Almir Maia e Silva, Luiz Gonzaga de Oliveira, Lúcia
F. Veloso, Lauro de Vasconcelos, Iobe Botelho e muitos outros.
Direção e narração de Wanderlino
Arruda, sonoplastia de Carlos Souto Peres”. A direção
e narração também vinham sublinhadas,
porque eram do presidente do Diretório e, tudo indica,
precisava de destaque. Não falava em Cerdônio
Quadros, não sei por que, mas tenho certeza de que
ele participava em muitas apresentações.
O
interessante é que, nos primeiros tempos, o Consultório
Sentimental não poderia funcionar sem as consultas
que deveriam ser feitas pelos ouvintes, jovens e adultos.
Anunciamos num domingo, noutro domingo, e como não
chegaram cartas, o jeito foi o Adauto fazer o papel de apaixonadas
e apaixonados consulentes, expondo em mal-traçadas
linhas, séries e séries de problemas pessoais.
A resposta de cada drama era eu quem dava, procurando oferecer
maior impacto e convencer todos os ouvintes de que a felicidade
e o amor sempre foram possíveis e sempre estiveram
ao alcance de todos. Algum tempo depois, chegavam dezenas
de correspondências ao estúdio, e o Consultório
tornou-se um verdadeiro sucesso... graças à
nossa persistência e aos problemas que o Adauto sabia
muito bem inventar...
Já não
sei mais quanto tempo durou o “Atualidades Estudantis”,
mas não posso ter dúvida do bom efeito didático
que causou na vida de cada um de nós. Aprender, todos
aprenderam, mesmo os que eram exageradamente novos para
o ano de 1955.
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