Com o terceiro artigo a respeito de Hermes de Paulo e do seu
livro sobre a história de Montes Claros e de sua gente,
espero ter cumprido a obrigação de despertar
muitos de nossos leitores do JORNAL DE DOMINGO para uma necessidade
cultural de relembrar outros do vasto leque de interesse folclórico
e genealógico de que dispomos nesta velha terra de
Gonçalves Figueira. Creio que falar de Hermes de Paula,
suas vivências, seus costumes, suas gentes é
o melhor caminho para a construção do edifício
histórico de Montes Claros. É bem verdade que
muita coisa ainda deve e precisa ser escrita, no presente
e no futuro, mas, mais verdade ainda é que ninguém
poderá faze-lo sem partir primeiro do alicerce erigido
por Mestre Hermes de Paula.
Com Hermes, vemos e revemos o bumba-meu-boi, as folias de
Reis, a dança de São Gonçalo, as marujadas,
os catopés, as cavalhadas, as penitências para
chover; com Hermes, ouvimos e aplaudimos as cantigas de ninar,
as rezas e benzeduras, as cantigas de roda. Com ele, sentimos
a dureza das secas de noventa, noventa e nove, trinta e nove,
o tempo bom e o tempo bravo. Com ele, visitamos as lapas,
lapinhas, laponas, que não são poucas; vemos
os gambás, os caxinguelês, os tamanduás,
os saruês. Com ele, reconhecemos todos os tipos de madeiras
das nossas florestas tamburil-de-cheiro, violeta, sucupira,
pau-de-abóbora, jacarandá-muxiba, catinga-de-porco.
No seu livro, aprendemos as virtudes de todas as nossas plantas
medicinais, entre elas a losna, a salsa, a alfavaca, o manjericão,
a quina-de-barroca e a catuaba, estas últimas, no dizer
do povo, mui valentes afrodisíacos, excepcionais para
levantar coragem.
Sobre a arruda, planta que dá sorte, diz Hermes de
Paula que é santo remédio para cólica,
como chá ou queimada na cachaça; serve como
linimento usando a folha pura; o sumo é próprio
para dor de ouvido e, no geral, atacado e varejo, é
tiro-e-queda para benzer contra quebranto e mau-olhado. Esqueceu-se,
no entanto, de dizer que arruda, folha ou galho, evita feitiço
e é um tremendo escorrega-menino, na hora de parto
de mulher.
“Montes Claros, Sua História, Sua Gente e Seus
Costumes” é um repositório de ótimas
informações sobre tudo que é Montes Claros:
fundação de clubes sociais, de escolas, de hospitais,
instalação de comércio e de indústrias,
fundação de órgãos de imprensa,
movimento religioso, incêndios maiores e até
informações sobre o dia em que alguém,
por aqui, chupou o primeiro doce gelado, também chamado
de picolé. Algumas observações curiosas
do livro: os jovens Antônio Augusto Veloso e Antônio
Augusto Tupimbá foram os últimos que ganharam
discursos e festas no dia da chegada depois da formatura do
curso superior. Pedro Santos, o famoso Pedrão 70, senhor
de muitas lendas, não é de Montes Claros porque
nasceu em São João da Ponte e estudou em Ouro
Preto, Juiz de Fora e Niterói. Curioso é que
Pedrão foi o maior campeão de corridas de todos
os tempos, jamais batido em 200, 400 ou 600 metros, o que
o levou a ser também um bom craque do futebol nacional.
Tendo sido eu um dos colaboradores da segunda edição
do “Montes Claros Sua História, Sua Gente e Seus
Costumes”, sinto-me dono de uma gratificante tarefa,
contente e bem recompensado pelo alto valor do livro. Afinal,
não é todo dia que podemos ser companheiros
de páginas de tão ilustrada companheiragem,
principalmente de Hermes de Paula, premiado com medalhas dos
governos de Minas e São Paulo e detentor da mais vasta
soma de conhecimentos sobre Vital Brasil, conferencista elogiado
e aplaudido em muitas capitais, homem do sertão e das
serenatas, defensor do pequi e do pequizeiro, intelectual
e pragmático, sem dúvida alguma, o melhor fazedor
de arroz-de-tropeiro e de quentão do mundo...
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