Desde que Haroldo Lívio publicou a crônica LIRA
DOS OITENT’ANOS, em setembro de 1986, que coloquei também
na minha intenção o nome de Maria Oliveira para
um escrito laudatório em que pudesse deixar patente
e documentada toda a minha amizade e admiração
que sempre tive por ela, desde os nossos dias de JORNAL DE
MONTES CLAROS, em torno de 54 e 55. Não sei de outra
pessoa que tenha trabalhado em jornal – em todos esses
anos que ando pelas redações – em que
eu possa reconhecer mais mérito do que reconhecia na
figura e no jeitão de ser de Maria, sempre amiga e
conselheira, eterno pensamento positivo, astral de cosmonauta
com olhos no céu e pés firmes no chão.
Para falar a verdade, sempre guardei a coluna do Haroldo,
com os elementos nacionais sublinhados em vermelho, de modo
a nunca me faltar os dados mais importantes, já que
ele, parente dela, tinha de conhece-la mais do que eu, principalmente
nos assuntos de família.
De dois meses para cá, estive sempre com o arcabouço
do que seria esta crônica dentro da minha pasta de trabalho,
para, a qualquer hora, fazer a redação final
e mandar para o JMC. Oito semanas, quase sessenta dias, e
nada de dar certo, de materializar a vontade, o velho desejo
de falar de Maria, e outros temas sempre passando na frente,
alguns até a exigir atualidade, que jornal tem muito
dessas coisas. O tema MARIA OLIVEIRA sempre acabou esperando.
Na minha chegada de viagem a Fortaleza, passando a limpo todas
as novidades, folheando correspondências, vendo papéis
diversos, lendo os jornais, vi no JMC, primeira página,
retrato e notícia da morte de Maria, aos 82 anos de
idade, depois de longa vida de dever cumprido. E o jornal
era do dia seguinte, com tempo ainda de assistir ao sepultamento,
uma derradeira despedida. O meu espanto foi que, nas últimas
horas, eu havia tentado escrever sobre ela pelo menos quatro
vezes, mas o tempo sempre me traindo em todas as oportunidades.
Esta crônica continuava sempre um projeto, embora permanentemente
presente na consciência, pronta para sair.
Como diz o Eclesiastes, há tempo pra tudo, para todo
propósito debaixo do céu, tempo de amar, tempo
de nascer e tempo de morrer, tempo de rir, tempo de chorar,
e, enfim chega o tempo da saudade por Maria Oliveira, amiga
e companheira de imprensa, mestra de boas maneiras, orientadora
de vida e de postura diante do mundo, diplomata da afeição,
velhice jovem e arejada, rara de se ver nas almas quase solitárias
como foi ela nos últimos tempos, em sua amada casa
da rua Tiradentes, pertinho da Praça Coronel Ribeiro.
Hoje, lembro-me com profundo amor das muitas horas que passávamos
conversando na sala de endereçamento e distribuição
do JMC, no vetusto prédio da rua Doutor Santos, salinha
de uma só janela e pouca luz, mas cheia, cheíssima
de entusiasmo pelas notícias e pelas personagens do
dia-a-dia, um laboratório de idealismo em que José
Prates, A.R. Peixoto e eu escrevíamos praticamente
tudo que era publicado. Dona Maria Oliveira fazia a coluna
dos aniversários, onde colocava datas, nomes e profissões,
dando mais ênfase, é claro, às pessoas
de quem ela gostava mais. Cada dia, uma aventura nova, uma
eterna tentativa de fazer da cidade um mundo mais civilizado
e mais agradável de se viver.
Maria de Oliveira tinha a firmeza das mulheres bíblicas,
a decisão de uma heroína, a beleza transcendental
de uma verdadeira mãe, nunca se excedendo em nada,
em tudo na medida certa, doce e harmoniosa, alegre, sorridente,
sempre pronta para um gesto de boa vontade, uma suave admoestação
quando necessária, principalmente diante do arrebatamento
de jovens jornalistas, que, muitas vezes queriam reformar
tudo.
Quantas e quantas reportagens sobre a violência política
ou mesmo sobre assuntos de política foram por ela reorientadas,
evitando aflorar velhas feridas ou justificar arbitrariedades
tão comuns naquela época. Maria era sempre uma
palavra de ponderação e entendimento!
Correndo, apressados, ansiosos, Olímpia e eu ainda
conseguimos chegar a tempo para presenciar a entrada de Maria
para o seu último refúgio de descanso na terra
dos Montes Claros, terra para ela mais do que sagrada, santo
campo de eternidade.
Era uma manhã de muito sol, clara, vistosa, a brisa
balançando as folhas das árvores e fazendo esvoaçar
os cabelos de parentes e amigos, atmosfera muito mais de respeito
do que de tristeza, coisa assim como um arco-íris de
lindo envolvimento emocional. De jornalistas e velhos companheiros
de imprensa, Haroldo Lívio, Ângelo Soares Neto,
Tião Camurça e Zé Branco. Poucos, mas
muito representativos para a amizade maravilhosa de Maria!
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