O
sertão de Antônio Ferreira Cabral
Wanderlino
Arruda
Surpreendeu-me
o meu amigo e bom irmão Antônio Ferreira Cabral
com o livro “O Sertão Norte-Mineiro”, capa
a uma só cor, editado aqui mesmo, lançado ao
apagar das luzes de 1985. surpreendeu-me porque ele nunca
falara em publicação de livro, nunca freqüentara
as rodas de literatos, pouco tem publicado de sua lavra em
nossos jornais, salvo engano, só no “Deus E Liberdade”,
e assim mesmo há muito tempo. Surpreendeu-me esse trabalhar
escondido em silêncio, isolado, sem qualquer propaganda
de trabalho audível ou visível até mesmo
para os amigos mais próximos. Trabalho de mineiro?
Serviço de quem não quer concorrente? Acanhamento?
Modéstia? Quem sabe. O certo é que o livro saiu
sem qualquer barulho, sem nenhuma publicidade, nem o próprio
autor apareceu para a dedicatória. Recebi o meu volume
por intermédio do meu colega de Banco José Lúcio
Gomes, juntamente com o que foi destinado ao companheiro Thiers
Antônio Penalva Ribeiro. Junto com o livro apenas a
cobrança do preço de venda.
Confesso que me espantou, inicialmente, a forma de armação
dos parágrafos, todos curtos demais, parecendo sem
costura ou alinhavados de forma apressada. A segunda impressão
era de que o livro só poderia interessar a fazendeiros
ou a pessoas necessitadas de dados estatísticos, pois
deu-me a idéia de uma monografia regional destinada
a historiar a economia do Norte de Minas. Cheguei a compara-lo
mentalmente, embora sem nada dizer a ninguém, com frios
dados dessas associações que só defendem
o próprio interesse e se preocupa apenas com a própria
sobrevivência. Mas, como errei, meu bom Cabral! Ledo
engano o meu folheamento apressado ainda em serviço,
em horas de aperto. Se antes eu o respeitava pelo zelo intelectual,
pelo respeito que sempre teve para com a língua portuguesa,
agora, companheiro, você quase me jogou para fora do
cavalo, e apresentou-se-me em nova dimensão. A modéstia
costumeira, a simplicidade incomum com que você se comportou
traiu-me na avaliação.
“O Sertão Norte-Mineiro”, quase com o estilo
do escritor Terezinho Caldeira Brant, é um livro de
leitura fácil, gostosa, bem concatenada, com uma conversa
amiga ao pé-do-fogo, contada por quem sabe muito bem
de todas as coisas. É uma história e uma estória
ao mesmo tempo, que serve para o hoje como informação
e entretenimento e para, o amanhã, como fonte de pesquisa,
uma espécie de ensaio a ser grandemente considerado.
Em ordem cronológica, tem redação de
advogado que gosta de ser claro ao juiz e não quer
confusão interpretativa nos seus pontos de vista. Além
de tudo, traz uma argumentação de quem conhece
profundamente o assunto, com direito à visão
científica e aos rodeios poéticos, num estilo
de narrador calmo e metódico, parece com a máquina
de escrever e um cigarro de palha funcionando ao mesmo tempo.
Não tenho dúvida, uma delícia de livro.
Antônio Ferreira Cabral fala de mineração,
do ciclo do gado, da agricultura, dos problemas políticos
e sociais, da chegada da estrada de ferro, da indústria
e do último dos ciclos econômicos, o carvão.
Fala de tudo isso, longe da linguagem dos economistas ou dos
estatísticos, ou dos geólogos, ou dos planejadores.
Também não fala como historiador preocupado
com a visão crítica ou problemática dos
dados. Cabral não é técnico, não
tem compromissos com a matemática ou a sociologia.
É um amigo que fala à inteligência e ao
coração do leitor, de forma amena, interessante,
tão interessante que nos dá vontade de ler o
livro todo de uma vez.
Esse Cabral descobriu em 1985 o Norte de Minas!
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