Educadores
e Jequitibás
Wanderlino
Arruda
Começou
com uma analogia feita por Rubem Alves, no livro “CONVERSA
COM QUEM GOSTA DE ENSINAR”, fazendo uma comparação
entre jequitibás e eucaliptos, para confronto ou sintonia
entre educadores e professores. Que diferenças existem
entre um educador e um professor? Que diferença é
entre um jequitibá e um eucalipto? Primeiramente é
bom lembrar as diferenças entre um antigo boticário
e um atual farmacêutico, entre um antigo tropeiro e
um transportador moderno. O boticário era um homem
que fazia tudo na farmácia: manipulava os remédios,
embalava-os nas mãos do cliente com o máximo
de carinho, quando não os levava ao leito do doente.
Boticário era a pessoa que tinha sempre um dedo de
prova para cada um que entrava na sua farmácia, era
o principal nariz do seu estabelecimento comercial, um dirigente
da cultura local, um distribuidor de notícias e conselhos,
um agregador social, um encaminhador de diretivas de vidas.
Um tropeiro era o homem que criava os seus animais, alimentava-os,
limpava-os, arrumava os arreios, cuidava das cargas zeladas
pela comida na trempe improvisada, fazia o pouso de dormida,
contava estórias para a sua equipe de viagem. Hoje,
o boticário é o farmacêutico que ninguém
vê, ninguém conhece nem sabe que existe, em farmácias
impessoais e apressadas, sem qualquer vínculo de consideração
humana. As exceções, claro, são raras.
O transportador nem existe mais em lugar do tropeiro. O que
há são empresas dirigidas por escritórios
que falam por telefone, controlam por computadores, com cheiros
de nada, distantes, tão distantes como os destino das
mercadorias que transportam.
E os educadores? Eram mulheres ou homens dedicados por toda
uma vida, mesclando suas existências com as existências
dos seus alunos. Eram detentores da sabedoria universal, ensinando
tudo, desde a higiene à história do mundo, desde
a língua pátria aos mais complexos problemas
de aritmética, da geografia à religião,
do desenho às ciências naturais, da economia
doméstica aos requintes dos salões. Era um tempo
em que formavam rapazes competentes e moças prendadas,
uma finura de nobreza, um ambiente em perfume de primavera.
Os professores de hoje, pelo menos os que não são
educadores, pobres coitados, são descartáveis,
mão-de-obra perfeitamente substituível. Ficam
em greves durante meses, entram em licença, saem de
férias, são demitidos, sem nada influir suas
ausências nas considerações dos governos,
da pátria ou do povo. No lugar de um entra outro, pouco
importa a competência ou o grau de conhecimento. A melhor
comparação é feita entre o jequitaí
e o eucalipto. O jequitibá é árvore de
longa vida, de 50, 100, 200 anos, passando de geração
em geração, útil e precioso. Ao contrário,
o eucalipto está maduro para uso em 4 ou 5 anos, pasto
para nenhum vivente, deserto verde, alimento para nada, toca
de silencia com ausência de pássaro e animais.
Verdade? Não adianta discutir, não adianta o
profissional moderno de ensino, ou trabalhador de ensino,
como gosta de ser chamado para efeito sindical, dizer que
não é bem assim. É o próprio mundo
que vem dissolvendo a tarefa do educador da mesma forma que
também quase acabou com o jequitibá, com a braúna,
a violeta, o jacarandá, o cedro, a peroba e já
quase com a sucupira. O jequitibá, forte e eterno,
simboliza o educador, tem o sentido de permanência,
é para a vida inteira, utilidade em todos os sentidos;
o eucalipto – descartável por natureza e quase
fora da natureza – é o professor, que não
mais acompanha o aluno, não mais dispõe de tempo,
não mais vive o problema do aprendiz, não mais
sente ou vive qualquer tarefa, um desesperado a correr de
escola em escola, de classe em classe para conseguir o pão
de cada dia, ou uma renda menos decepcionante. Professor já
não sabe o nome do aluno; aluno já não
se interessa mais pelo professor, nem de onde vem, nem para
onde vai. Materiais de consumo de expediente, uns e outros.
Nada mais!
O não dar certo em muitas coisas do mundo de hoje é
problema de falta de fidelidade, de interesse, de motivação,
de incentivo, da incapacidade de sonhar. O não dar
certo na profissão de educador é que os governos
não mais se interessam pelo problema do ensino, jogando-o
de escanteio, livrando-se dele, principalmente porque o ensino
nos lhe dá as interessadas vantagens adicionais, têm
as campanhas políticas. Como tirar percentagens, o
famoso terço, de folhas de pagamento? Assim, infelizmente
muitos educadores com vocação de educadores
acabam tornando-se simplesmente professores. Como eucaliptos.
Sem fidelidade, sem compromisso de vivência total. Sem
desenvolvimento da capacidade de ternura, do refinamento,
do interesse pessoal pelo que faz.
Feliz do educador que ainda consegue guardar a fidelidade
e a vocação do tropeiro e do antigo boticário.
Esse merecerá, sem dúvida, um cantinho nos jardins
celestes!
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