Doutor
Santos vista de perto
Wanderlino
Arruda
A
Rua Dr. Santos começava mesmo era no Bar de Manoel
Cândido, onde ficava hoje a Caixa Econômica Estadual,
e no Banco Crédito Real onde funcionam as Pernambucanas.
Depois era o barzinho de Adail Sarmento, mais café
do que qualquer outra coisa, pois, lugar pacato, sério,
onde nem viajante do Hotel São Luiz podia fazer barulho
e conversar alto, tudo com muito respeito ao lado de um mini-restaurante
em que alguns estudantes mais bem postos na vida – como
o Ivan Guedes – podiam tomar semanalmente um pequeno
lanche, com gorjeta para o garçom. Pensando bem, o
bar ou café de Adail Sarmento era um quase sucesso,
com tiras de bilhetes de loteria e açúcar refinado
retirado do vidro com colherinhas compridonas, bem ao olho
do dono reclamador dos exageros. Quando um dia um viajante
encheu a xícara todinha de açúcar, Adail
perguntou a ele por que gostava de café tão
amargo... De lá saíam muitas estórias
para a portaria do hotel no outro lado, onde muitos anos depois,
ainda falavam de saudades do bom Sebastião Sobreira,
que de tão bom, no dia em que morrera, os pobres choraram
nas ruas no meio de muitos lamentos pela perda do amigo e
protetor.
Era no Hotel São Luiz, nas quintas-feiras, à
noite, a reunião do Rotary Clube, a mais fina nata
da aristocracia montes-clarense, lugar em que pontificavam
inteligências e interesse pelo bem público, como
João Souto, Nozinho Figueiredo, Moreira César,
Niquinho Teixeira Fontes, Cel. Coelho Gentil Gonzaga, Chico
Tofani e Nathercio, entre os que se foram, e Luiz Pires, Antônio
Augusto Athayde, João Valle Maurício, Lezinho,
Baendel, Geraldo Guerra, Luiz de Paula, Levy Peres, entre
os muitos que ainda estão muito vivos. Luiz de Paula,
no meu acompanhamento de jovem repórter, foi o melhor
presidente que conheci, quando uma noite no Rotary dava tanto
assunto que, no dia seguinte, eu escrevia todo o JMC, com
exceção da página de polícia.
Até para crônica social do A. R. Peixoto, e,
mais tarde, dos J. e J., eu fornecia dados para fazer sucesso.
Era uma festa e tanto, e nenhum assunto importante poderia
ser sugerido ou resolvido sem passar por lá.
Um pouco acima ficava a farmácia do Juca de Chichico,
com ele sempre muito falante, alegre fazendo trocadilhos,
mexendo com um e com outro que passava, bem vestido, já
não muito novo, mas bastante saudável para viver
intensamente como gostava.
Dele me lembro muito bem nos dois extremos da rua, porque
encontrávamos também muitas vezes por dia no
Hotel São José, lá no fim, na praça
Cel. Ribeiro. Era a única farmácia da Rua Doutor
Santos, antes de Montes Claros ser o maior paraíso
de farmácias da face do planeta Terra. À frente,
o Banco Hypothecário e Agrícola, de Mauro Moreira
e Lidehir, com placa ainda escrita com “y” e com
“th”, contrastando já com certa modernidade
dos bancos de João Damásio, que era chamado
de Barroso, e de “Seu” Armando, o Bancomércio,
onde trabalhavam Gil Meira, o Luizão Martins e Theodomiro
Paulino, o Theo quase menino.
O barulho ficava por conta da loja de rádios e eletrolas
e geladeiras e discos de 78, do Dizinho Bessa, uma precursora
das modernas lojas de muita propaganda, aonde muitas vezes
fui buscar anúncios para o Jornal. Era um contraste
com a linha de grande elegância e silêncio da
“Renner” de Nathércio França, com
camisas de colarinhos trubenizados e os ternos vindos prontinho
de Porto Alegre, da maior elegância, juntamente com
passagens aéreas a antiga Nacional de vôos diários
para Belo Horizonte e Salvador. Nathércio, com João
Leopoldo brotinho, cantor da jovem D-7 e com testes na Rádio
Nacional do Rio era o melhor e mais ponderado papo de tudo
que cheirava ao atual da cidade e do país. Creio que,
além de ternos e passagens de avião, a gente
poderia comprar lá também gravatas, lenços
e cuecas samba-canção, em grande evidência
naquele tempo.
Como vêem, não chegamos ainda nem ao JMC, que
ficava em frente à Padaria Santo Antônio, onde
o cheirinho de pão quente era uma gostosura...
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