Dez
anos de tintas e pincéis
Wanderlino
Arruda
Lembro-me como se fosse ainda hoje o dia em que, na casa de
Samuel Figueira, eu dera palpites, mais do que o usual, na
sua forma de pintar, no uso das cores, na escolha dos temas
e creio que até na evolução dos seus
quadros. Devo ter exagerado na função de crítico,
e foi daí que veio o desafio: Por que eu, que queria
saber tanto de pintura, não tentava fazer um quadro
ali mesmo, diante dele, de Mila, sua mulher, e de Shirley
Durães, que os visitava naquela tarde de domingo? Insulto
ou convite, chamamento ou convocação, fosse
o que fosse, não me fiz de rogado e lancei-me ao trabalho,
imediatamente, pintando a minha primeira paisagem azul, branca
e verde, chapada, lisinha e até com um pouco de transparência.
Para começo, creio que foi até um sucesso, em
pouco mais de duas horas, com ele Samuel orientando aqui,
orientando ali, e até ajudando dar uns retoques nos
coqueiros, porque me faltava naquela hora uma certa leveza
que, aliás, falta até hoje.
Há poucos dias, em Mirabela, Shirley me lembrou da
façanha e perguntou-me se valeu a pena todos estes
anos de aventura no mundo dos tubos de tinta, de pincéis,
de espátulas e de telas. Quis saber também se
eu me considerava mais feliz com a atividade de pintor, metiê
que sofre tanta crítica de quem entende do assunto
e até muito mais de quem não entende nada. E
qual seria minha resposta?
Claro que tudo vai bem, a pintura tem sido um grande passa-tempo,
um exercício de paciência realmente maravilhoso,
uma nova fonte de estudos, um encontro e reencontro com a
arte que tem atravessado séculos de admiração
e encantamento. Quando estou pintandio, as horas passam como
verdadeiros sonhos, interessantes, cheias de gratificação
mental, gostosas mesmo. E quanto às críticas,
principalmente as desfavoráveis, têm-me ajudado
muito, contribuem para mudanças e busca de melhor desempenho.
Na verdade, não sei como ando, porque há muito
tempo não me encontro com Samuel e com Konstantin,
meus dois orientadores mais exigentes que, elogiando, ainda
fazem reparos, dão sugestões, nunca se mostram
totalmente satisfeitos. Não falo de Godofredo, porque
este nunca acha boa a pintura de ninguém e só
raramente dá uma palavra de incentivo, tanto faz para
velho como para novos. É que o bom GG acha a profissão
muito sofrida, trabalhosa, difícil. E também
para ele, pintura só vale a clássica –
acadêmica - a real nas cores e na forma. Essas invenções
nossas são coisas de gente que acha que sabe, mas,
não sabe... Cristina, há poucos dias, olhou
quase tudo que preparei para a minha exposição
do dia 3 de julho, no Centro Cultural, disse que gostou, mas,
perguntou porque eu havia abandonado a pintura de flores...
Os críticos da família, a Olímpia, a
Wladênia, a Rízzia, a Nádia, estas seguem
cada trabalho e servem de “feedback” no exato
minuto de cada pedido de avaliação. Wlader,
Danilo, Denílson,Wanderlino Filho andam meio ausentes
no momento.
É o que tem acontecido e não posso me queixar.
Não me têm faltado os melhores e mais proveitosos
momentos nestes dez anos de trabalho, exatamente quando vou
completar o primeiro meio século de vida. Pintar tem
sido uma distração, uma forma de paz interna
e externa, uma evocação de viagens, um rememorar
de paisagens. Depois que comecei a pintar, a Natureza jamais
passou por mim (como eu tenho passado por ela), como página
em branco. Cada estrada, cada pedaço de céu,
cada folhagem, uma superfície de água, por menor
que seja, é sempre uma festa para os olhos e para a
imaginação. O pintor é um ledor de cores,
de movimentos, de formas, um visualizador e dimensões
que existem e que não existem...
Já ia me esquecendo de fazer um conserto sobre o relacionamento
de Godofredo com os seus colegas menores da arte pictórica.
Ele não gosta é de pintura dos outros. Dos pintores
ele tem sido grande amigo. No que me toca, o mestre Godô
só tem me dado palavras de entusiasmo. Talvez seja
eu a única pessoa a quem ele tenha procurado ensinar
as técnicas de pintura. E sou-lhe muito grato por isso!
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