A
nudez do verão
Wanderlino
Arruda
Chega
o verão e com ele toda a nudez das piscinas e das praias,
espocando universos de peles douradas de mulher jovem. Poderia
isso não ser novidade, uma vez que todos os anos têm
os seus dezembros e todos os dezembros seus dias de sol e
calor. Mas acontece que neste ano da graça de mil novecentos
e oitenta e quatro há novas visões de mais centímetros
quadrados à mostra, como diria Simeão, em todos
os hemisférios da gente feminina. Os maiôs minha
senhora, ficaram mais bikiníssimos, quase translúcidos,
finos, beirando a inexistência pura e sim descoberta
por Cabral, um português com posto. Aqui e em toda a
parte deste gostoso país de almirante que veio por
cá descobrir as índias. Desde 1500 e com nudez
nem sempre castigada...
A notícia nos chega das praias do Norte e do Sul, de
todo o nosso lindo litoral. Nunca houve tanto feminino pelo
ar descoberto, tudo natural com estilo bem apropriado para
quem, com juventude, bem desfila a formosura. Sorte lançada
desde o início do mês, salgada ou doce, quente,
penetrante nos olhos como o sol, fazendo cabeças da
moçada, deixando ouriçados os corações.
E nem precisava notícia de fora porque, por aqui mesmo,
a visão que encanta já se acha até inflacionada
à beira de muitas águas. Quanta distância
dos maiôs de gola e fitinhas de joelho das nossas vovós!...
Quanta mudança a mais na descontração
de quem pode e sabe usar as peças moderninhas!...
Dizem que a verdadeira roupa do verão é a cor
da pele, o dourado cobrindo todo o corpo por inteiro, numa
ousadia do mostrar, do investir na sedução plena
e arrasadora, cúmplice e solidária. Dizem que
o verão é tempo de alegria como nenhum outro,
salpicado de liberdade, cheio de férias e feriados,
tempos de Natal, de viagens, eterna folga, constância
de folguedos. Verão, quando as temperaturas sobem e
as pressões chegam ao máximo pela própria
existência das horas de balanço e de sonhos de
um ano novo que muito promete.
Neste dezembro de muito sol, a novidade está solta,
o senso estético renovado, só beleza pura porque
nenhuma gordurinha mais pode ser encontrada, nada de celulites
ou coisas de estragar as vistas.
Da Bahia, do Rio de Janeiro, de praias mil, os novos nomes
dos pedacinhos de panos que cobrem as vergonhas que quase
já não são: cortininha, cordãozinho,
enroladinho, biquininho tapa-sexo, corisco. Corisco, porque
só deixa o risco... Quem queira usá-los tem
de parecer bem natural, personalizar o máximo, estilizar
dar a cadência e o balanço de Ipanema ou Itapoã.
E será que isso é novidade? Pero Vaz de Caminha,
escrevendo a El-Rei D. Manuel de Cabral, mostra o sucesso
quando diz “que entre todos que vieram não veio
mais do que uma mulher, moça, a qual esteve sempre
à missa, a qual deram um pano com que se cobrisse;
e puseram-lho em volta dela todavia, ao sentar-se, não
se lembrava de o estender muito para se cobrir. Assim Senhor,
a inocência dessa gente é tal que a de Adão
não seria maior...”
Na verdade, o Almirante não tinha nem mesmo o que descobrir...
Nem o teria hoje, se suas naus chegassem e aportassem em Copacabana
ou em Camboriú... ou mesmo aqui nas piscinas de Figueira...
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