Dona
Joaninha Braga
Wanderlino
Arruda
De
certo modo, a vida de Dona Joaninha
– Joana Versiani Braga
– minha boa amiga mãe
de Maria Inês e de Sinhá,
teve a marcação
dia-a-dia do tempo, tempo também
de todas as horas, claro-escuro
de sol e de lua, tempo de estrelas
que marcam brilho de luz e,
muitas vezes de dor. Dona Joaninha,
se foi do tempo de repórter
de jornal, se do tempo de aluno
de geografia de Maria Inês,
se do tempo de funcionário
do Banco do Nordeste, em que
eu passava lá n Rua João
Pinheiro, onde ela morava, tardes
infindáveis conversando
com ela. Dona Joaninha não
dava notícia somente
do tempo, ela conhecia a cidade
e o povo, os costumes e a história,
ela amava a terra e as gentes.
Tinha um gosto de cultura, uma
garra de se admirar, uma grande
vontade de viver! O interesse
de Dona Joaninha pelas atividades
de cada um era realmente marcante.
Não eram perguntas formais
de quem só as faz para
manter conversa, eram realmente
de sadia curiosidade, de busca
de conhecimento, informações
sérias. Ela nunca perguntava
por perguntar. Perguntava porque
queria saber!
Agora, com noventa anos cravados
nos ponteiros do tempo, quase
uma rodada de século,
Dona Joaninha se despede dos
amigos. Dona Joaninha deixa
Montes Claros, materialmente,
do plano físico, numa
pausa de saudades. Leva e deixa.
Muito da cidade, principalmente
do romantismo, de um velho tipo
de amizade, do carinho provinciano,
muita coisa da antiga Montes
Claros vai com ela. A cidade
agora já é outra:
moderna, confusa, barulhenta,
sem tempo... Sem Dona Joaninha,
de conversa gostosa e amiga.
Com Dona Joaninha, não
demora, irá até
o século, que ela viu
nascer, e acompanhou, que ela
viveu, com todas as sus modificações
para melhor e para pior. Dona
Joaninha foi uma testemunha
de noventa anos!
Dona Joaninha, que nunca poupou
tempo ara marcar o tempo, morreu
feliz, tranqüila, sem sofrimentos
visíveis, envolta numa
linda serenidade. Morreu quase
sorrindo, depois de noventa
anos de trabalho de coração
jovial. Duas semanas antes de
Dona Joaninha partir, o tempo
brasileiro já não
mais precisava ser marcado pelo
humano esforço, nem dela,
nem de ninguém. O serviço
de informática tomara
conta. O computador assumiu
a tarefa, deixando de lado o
sentimento, o amor, a gratidão
a Deus pelo fazer e desfazer
a luz ou a sombra, o frio e
o calor, os ventos e as chuvas.
Não importa, o tempo
há muito tempo já
não estava com Dona Joaninha.
Afinal, o tempo para ela já
era só uma saudade. Coisas
do tempo...