O
grande ditador
Wanderlino
Arruda
Sinto muito, mas, não
quero ser ditador. Não
quero governar, nem conquistar
ninguém. Desejo ajudar
a todos – judeus, brancos
e negros. Ajudar ao mundo todo,
aos que iniciavam o grande processo
de violência, aos que
não tinham nunca enganado
a ninguém, nem mesmo
antes de assumir o poder. Queria
ajudar aos que não respeitavam
nem os direitos nem os deveres
de ninguém, nem à
fome dos famintos, nem à
vergonha dos envengonhados.
Será que todos nós,
os seres humanos, somos assim?
“Queremos viver para a
felicidade. Não queremos
o ódio e o desprezo entre
as pessoas. Neste mundo há
lugar para todos”. Há
sim, há lugar para todos,
mesmo para os que não
comumgam pela nossa cartilha
e que não andam pelo
nosso caminho, e para os que
não batem palmas para
nossas palavras.
“O caminho da vida pode
ser formoso e livre, mas, já
perdemos a direção.
Os apetites envenenaram a alma
dos homens e nos têm levado
à mistura e à
matança. Desenvolvemos
a velocidade, mas, nos perdemos
nela. A máquina, que
deveria criar nossa fortuna,
criou a dependência. A
sabedoria nos fez cínicos.
A inteligência, duros
e maus. Pensamos demasiadamente
e sentimos muito pouco. Necessitamos
mais de humanidade, que de máquinas.
Mais de bondade e ternura, que
de inteligência. Em isso,
a vida se torna violenta e tudo
se perderá”. E
até quando a violência
será a tônica de
quase todas as ações
do homem, principalmente de
quando os homens, dizendo-se
iguais, querem ser mais iguais
na própria violência?
Até quando, Catilina?
Até quando, o que só
é mais forte porque está
no poder, pisará no mais
fraco, que tem de aceitar as
suas condições?
“O avião e o rádio
nos aproximam. A verdadeira
natureza destes inventos fala
da bondade do homem. Eles são
um grito que apela à
fraternidade universal, à
união de todos. Neste
momento, a minha voz alcança
milhares de seres no mundo,
milhões de desesperados:
homens, mulheres e crianças.
Vítimas de um sistema
que tortura o homem e encarcera
os inocentes. Quero dizer àqueles
que me podem ouvir: não
se desesperem. A miséria
que caiu sobre nós vem
da ambição e do
ódio dos homens, que
temem o progresso humano. Mas,
o ódio passar, os ditadores
morrerão, e voltará
ao povo o poder que lhe foi
arrebatado. A liberdade não
morrerá enquanto os homens
morrerem por ela”.
Quase meio século nos
separa da mensagem de Charles
Chapplin em “O Grande
Ditador”, filme a que
assistimos ainda no velho Cine
São Luiz, exibido muitas
vezes, creio que ainda durante
a vida do maior dos ditadores
do nosso século, Adolfo
Hitler. Lembro-me muito bem
a impressão que esse
filme nos causou na década
de cinqüenta, jovens estudantes
cultores da liberdade no Grêmio
do Instituto Norte Mineiro.
Parecia o fim do mundo a própria
escuridão do cinema,
enquanto o filme era rodado.
Em nossas cabeças, por
outro lado, uma grande idéia
de segurança quanto a
tudo que o mundo já oferecia.
A palavra livre, o sonho de
desenvolvimento, a esperança
de todos os jovens, pobres e
ricos com todas as oportunidades
pela frente. Foi um tempo bom,
distante de fantasmas. No governo
de Minas governava um homem
com o coração
do tamanho do mundo: Juscelino
Kubitschek.
Tudo passa. Vai e volta a esperança.
A idéia de liberdade
nunca morre. Pobre de quem abusa
do poder, direta ou indiretamente,
porque a roda do destino tem
sempre a mesma direção,
e nunca deixa de voltar ao ponto
de partida.