“Todo mundo é gente”
Bom teatro, com todas as características do moderno humanismo cristão, “Todo Mundo é Gente”, de Luizinha Barbosa Lopes, tem todos os temperos para o divertimento e a sadia aprendizagem da vida atual. Não é uma peça grande, pois, em apenas um ato, mas, uma grande peça de indiscutível valor intrínseco, contrabalançado pelo que há de melhor na didática, com áreas bem delineadas no cognitivo e no afetivo, além de um seguro alinhavo no campo religioso, com muita religiosidade sem sectarismos e sem tiradas místicas. Simbólica, movimentada, colorida, “Todo Mundo é Gente” tem o condão de mostrar a interação do humano e do divino, investido na seriedade e no humor, garantindo continuado interesse do princípio até a apoteose final, quando prova, sem deixar nenhuma dúvida, que Deus é realmente brasileiro e talvez montes-clarense. Na verdade, Luizinha busca ampliar a Natureza, buscando estender os reinos naturais do mineral, do vegetal e do animal para mais dois, com o hominal e o divino, concentrando tudo na área do humano.
Se a violência animaliza o homem, a inocência e o amor humanizam o que é tido como irracional. Personagem principal, Jesus participa diretamente das preocupações e dos efeitos de cada atitude grupal, alertando e imprimindo concepções de vida, sem violência e sem pressa, apenas com um doce e angelical interesse pela felicidade do mundo. O divino não se arvora em juiz, não julga ninguém, não toma partidos, simplesmente ajuda, ouve, entende e convive com sua fraternidade.
“Todo mundo é Gente” não é um grito de alerta, é um chamamento à fé e à simplicidade, uma tentativa de se conseguir a igualdade pelos condimentos fraternos do respeito aos direitos de cada ser. Para provar isso, a figura mais humana é um burrinho, magistralmente bem humorado e bem interpretado por Marília Oliva de Abreu, que só não absorve toda a peça porque suas colegas de trabalho foram encantadoramente bem treinadas para um notável desempenho. Jesus é a figuração perfeita da bondade e do bom senso e permanece todo o tempo no amoroso sorrido de Maria Thereza Gonçalves Terence, suave e bonita.
Personagens com nomes de anagrama, na afirmativa de simbolismo, Zabelê (Luciana Amaral de Freitas), Davi (Patrícia de Oliveira Abreu), Dumon (Juliana Lessa Lopes), Mora (Jane Barbosa Lopes), têm todas as letras das palavras Beleza, Vida, Mundo e Amor. Justa (Vanelly Carvalho Quintino) e Benigna (Luciene Ferreira de Queiroz) não têm trocadilhos, representam mesmo a Justiça e o Bem. Não sei como Lourdinha Lopes Braga, Lilita Castro e Luizinha conseguiram em tão pouco tempo preparar tão bem essas meninas, tão seguras estão nos seus papéis, como se fossem profissionais do teatro, dispensadas de maquiagens complicadas e de efeito naturais à encenação. O palco quase vazio, com o Jesus transportando muito humanamente uma cadeira de um para outro lado, transfigura-se num mundo vasto e vivencial.
Quero felicitar a todos que contribuíram para o magnífico trabalho e para o resultado filosófico e utilitário de “Todo Mundo é Gente”. Poderia dizer até que a peça é política, mas política que religiosa. Poderia apresentar outros qualificativos no quadro da literariedade, onde Luizinha é conhecedora da teoria e da prática, sabendo muito bem trabalhar com ambigüidades e muita figuração. Desejo, entretanto, dizer apenas que ela conseguiu uma excelente contribuição à melhoria do humanismo, mostrando que a problemática social pode ser resolvida com o esforço de cada indivíduo, mesmo na vida do dia-a-dia. Participantes do real, vivemos um mundo de sonhos. Sonhando, transformamo-nos num gostoso universo onde as dificuldades só existem para quem não sabe resolve-las. Viver é perigoso mas é muito bom! Quem duvida disso?