Por que não ser otimista?
Meu caro Olyntho da Silveira,
Quanto tempo, amigão, estou lhe devendo um comentário sobre seu livro “Cantos Chorados”, publicado aqui mesmo em nossa terrinha! Será que não foi minha promessa a você, de ser este meu primeiro assunto, o que me espichou tanto o tempo de voltar ao JORNAL DE DOMINGO? Será que, intimamente, eu estava temendo dizer ao setentão Olyntho que sua felicidade de ter Maria Luísa, linda netinha, lhe entorpeceu a fé e a sabedoria? Será que eu temia tanto discordar do amigo, a quem prezo tanto a inteligência e a lógica, agora, amargo e descrente, auto-iludido por varejo no balcão da humanidade? E onde estava ou por onde caminhava a sinceridade de quem nunca lhe pediu palavras na briga ou na concórdia? Perquirições, amigo, porque indagar não é pecado! Nem só você tem o direito de errar...
Quero dizer-lhe que, de fato, os seus “Cantos Chorados” me fizeram triste com amargor da primeira parte, um desavisado pranto tardio, por mais incrível que pareça, irracional para um homem sábio como Olyntho. Uma confissão perigosa para jovens, fel desnecessário, inesperado para quem conhece sua alegria de viver, o interesse pela vida e pelas coisas, você um formal criador de admiração por toda parte. Os versos “Eu vim passando pelo tempo, / porém sempre chorando, / antevendo o fracasso” de “O Ciclo da Vida”, e “nunca atingi aquilo que sonhei, / embora sem saber o que bem seja, / pois, nem sempre se sabe o que deseja”, e mais ainda – “Valeu a pena ser gerado, / desenvolver a ter nascido / neste mundo desvairado?” – perdão Olyntho, que amarga miopia! Afinal, o que tem você com a religião dos outros, se martirizando com as mudanças, com a evolução natural, que nem você nem ninguém pode segurar no tempo ou no espaço? Você diz no “Credo” acreditar no criador dos mundos, “Chamem-no Deus ou mesmo natureza” e acha isso ainda pouco? Ora, amigão, deseja um pedestal maior?
Olyntho, você não tem nada a ver com o que os outros pensam ou como os outros agem, transformando idiossincrasias em motivo de desilusão. Veja como a segunda parte do seu livro é toda ela motivos de certeza no destino humano! Maria Luísa, a neta, começa para você novo ciclo de vida, a inocência, o sonho, a luminosidade do futuro. Nada de “Bailado de Vermes”, de “Dúvida Cartesiana”. Muito ao contrário. A vida é uma prece, alegre como o vento, como os rios, como os pássaros, como as árvores em tempo de chuva, ou em tempo de flores. O deus, Olyntho, traz sempre uma mensagem de esperança de um novo encontro ou reencontro. A vida é eterna, luz que não se apaga, um indescritível soma de momentos, muitos deles supremamente felizes e gratificantes. Você mesmo dá a resposta no soneto “Remorso”, quando fala nas “lágrimas que a noite chora, / cintila na florinha que reponta / escondida num galho, donde aflora”. É a beleza da vida, o universo numa gota de orvalho, que o poeta vê e aprecia.
No “Canto a Morfeu”, você me dispensa de dar-lhe a chave que venha abrir as portas do futuro. “Quando à noite vens / devagarinho os olhos meus cerrar, / ao despertar-me eu fico a avaliar / o simbolismo terno que deténs”. Passe, amigo, do fugaz ao eterno e eis a continuidade sublime da vida, fluente e bela, um sonho que nunca se acaba.
Antes de terminar, quero dizer-lhe mais uma coisa: as divergências ficam apenas no plano das idéias, no fundo. A forma, o visual e o tônico, o estrato, como diria a professora Yvonne Silveira, sua mulher, estão sensacionais, com o trato de quem sabe escrever! E bem!